sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O pintor cego.



De repente as luzes se apagam, termo que usaria tempos depois para descrever sua súbita cegueira.
Era um homem jovem de uns trinta anos que de um dia para o outro se viu no escuro. Para suprir a ausência de luz passou a mexer com as tintas. Conhecia as cores e o impacto que causavam na mente humana, nunca fora pintor, porém agora sentia necessidade de se expressar através da pintura.
O único inconveniente era de que não conseguia diferenciar as cores, pois os tubos eram padronizados e o cheiro e a consistência das tintas era praticamente a mesma. Decidiu pedir ajuda a um amigo de infância. Sempre que seu amigo tinha tempo livre os dois se reuniam e foi desta maneira que iniciou seus estudos.
De tempos em tempos abria as portas da casa e convidava os vizinhos para verem seus trabalhos. Gostava de perguntar aos vizinhos quais sensações tinham diante dos trabalhos. Costumava dialogar bastante nessas ocasiões, saber como era o dia-a-dia deles, no que acreditavam, se tinham algum objetivo ou temiam algo. Sentia-se consagrado quando os vizinhos entendiam sua mensagem e sentiam o mesmo que ele diante do quadro.
Era sensível a que todas as pessoas possuíam um sistema de significação próprio, porem seus quadros penetravam em suas mentes explorando aqueles sentimentos universais comuns a todos os seres.
Sua casa ficou pequena para comportar a quantidade de apreciadores. Expora em salas comerciais, espaços públicos, refeitórios de empresas, sedes comunitárias. Seus quadros freqüentavam todas as moradias até que chegou aos grandes salões reconhecido e agraciado depois de anos prestados em beneficio da vida.
Seu amigo sentindo-se desprestigiado era reconhecido como o amigo ou o ajudante do pintor, passou a manipular o trabalho do pintor.Quando este pedia determinada cor o ajudante oferecia outra que lhe agradava mais. Os trabalhos continuavam tendo a sensibilidade e a labuta do pintor, porém as cores eram da escolha do ajudante e o sentido da obra fora alterado.
Foi agraciado como um revolucionário das artes, intitulado o renovador da norma estética e da expressão humana. Não entendia o que estava acontecendo, sentia que os fatos fugiam a seu controle e suspeitava que sua mensagem não estava sendo compreendida.
Sua produção e motivação diminuíam enquanto os pedidos aumentavam. Organizou uma série de seus últimos trabalhos e montou uma exposição. Perambulava pelas salas da galeria tentando ouvir o que diziam dos trabalhos. Aproximou-se de um observador que ficou horas diante de uma grande tela e perguntou o que o trabalho lhe transmitia.
-          É lindo, não consigo captar a mensagem, mas as formas, as técnicas do artista são excelentes. A cor organiza o quadro o deixa atraente relaxante. Possui um sentimento que é sobre humano.
O pintor guardou os pincéis e as tintas e nunca mais pintou. Preferiu a reclusão a enganar as pessoas.

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