De repente as luzes se apagam, termo que usaria tempos depois para descrever sua súbita cegueira.
Era um homem jovem de uns trinta anos que de um dia para o outro se viu no escuro. Para suprir a ausência de luz passou a mexer com as tintas. Conhecia as cores e o impacto que causavam na mente humana, nunca fora pintor, porém agora sentia necessidade de se expressar através da pintura.
O único inconveniente era de que não conseguia diferenciar as cores, pois os tubos eram padronizados e o cheiro e a consistência das tintas era praticamente a mesma. Decidiu pedir ajuda a um amigo de infância. Sempre que seu amigo tinha tempo livre os dois se reuniam e foi desta maneira que iniciou seus estudos.
De tempos em tempos abria as portas da casa e convidava os vizinhos para verem seus trabalhos. Gostava de perguntar aos vizinhos quais sensações tinham diante dos trabalhos. Costumava dialogar bastante nessas ocasiões, saber como era o dia-a-dia deles, no que acreditavam, se tinham algum objetivo ou temiam algo. Sentia-se consagrado quando os vizinhos entendiam sua mensagem e sentiam o mesmo que ele diante do quadro.
Era sensível a que todas as pessoas possuíam um sistema de significação próprio, porem seus quadros penetravam em suas mentes explorando aqueles sentimentos universais comuns a todos os seres.
Sua casa ficou pequena para comportar a quantidade de apreciadores. Expora em salas comerciais, espaços públicos, refeitórios de empresas, sedes comunitárias. Seus quadros freqüentavam todas as moradias até que chegou aos grandes salões reconhecido e agraciado depois de anos prestados em beneficio da vida.
Seu amigo sentindo-se desprestigiado era reconhecido como o amigo ou o ajudante do pintor, passou a manipular o trabalho do pintor.Quando este pedia determinada cor o ajudante oferecia outra que lhe agradava mais. Os trabalhos continuavam tendo a sensibilidade e a labuta do pintor, porém as cores eram da escolha do ajudante e o sentido da obra fora alterado.
Foi agraciado como um revolucionário das artes, intitulado o renovador da norma estética e da expressão humana. Não entendia o que estava acontecendo, sentia que os fatos fugiam a seu controle e suspeitava que sua mensagem não estava sendo compreendida.
Sua produção e motivação diminuíam enquanto os pedidos aumentavam. Organizou uma série de seus últimos trabalhos e montou uma exposição. Perambulava pelas salas da galeria tentando ouvir o que diziam dos trabalhos. Aproximou-se de um observador que ficou horas diante de uma grande tela e perguntou o que o trabalho lhe transmitia.
- É lindo, não consigo captar a mensagem, mas as formas, as técnicas do artista são excelentes. A cor organiza o quadro o deixa atraente relaxante. Possui um sentimento que é sobre humano.
O pintor guardou os pincéis e as tintas e nunca mais pintou. Preferiu a reclusão a enganar as pessoas.
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