segunda-feira, 25 de outubro de 2010

série dialogos. Eva.

Alguém:
-          Ah é tanta poesia, tanta coisa escrita e diferente. Como pode tamanha desordem?
-          É que existem três tipos de poeta. Existe o poeta do olho, existe o poeta da boca e existe o poeta do meio.
-          Qual a diferença entre eles?
-          O poeta do olho é o que mais ama. O que mais sofre. É aquele que atravessa a noite namorando a lua. O poeta da boca é o que mais deseja. É aquele que devora com a força da mente. Já o poeta do meio é o mais intermitente, o mais intenso. Ama, ama loucamente, cego engajado, até o gozo.
-          E aquele que ama mãos, pés, orelhas e joelhos? Perguntou sorrindo.
-          É um mentiroso, ou melhor, é como lagarto se aquecendo, gosta de caminhar sobre a grama, gosta do atrito, aumentando a intensidade, retardando a chegada. É qualquer um. São todos.
-          E o poeta devasso?
-          Este, bom, este não é. É sobrenatural.
-          Em quem eu posso confiar?
-          Isto depende do seu desejo, da sua libido, sua curva, insinuação, seu olho, sua boca, seu meio.
-          Mas assim não há como escolher?
-          Imaginas então como sofrem os poetas, amando, amando, querendo, desejando, todas as luas, todos os sóis e chuvas, tudo o que desperta e se abre, todas as curvas, a dança e dissimulação, os cheiros, todos os olhos brilhantes, todas as bocas libidinosas, entreabertas, todos os meios ostensivos, provocantes. Imaginas o quanto sofrem, agora que conheces o pesadelo dos poetas.
-          Qual deles mais sofre?
-          Todos sofrem a sua maneira. O poeta do olho imagina como seria, mesmo que ela não queira, não esteja disponível, nem mesmo aberta. Ele sonha, imagina, cria. Não importa o que aconteceu, é dali adiante. As donzelas não devem se preocupar, pois nesta fase do olho que pode durar um instante o poeta não vê carne, olha extasiado, alimentado. Este é o pior momento da vida do homem, a distância entre os corpos às vezes é um passo, mas os sentidos não se articulam, não há movimento, reina a paralisia. Isto, digo, refere-se às mulheres inocentes, aquelas que olham sem olhar, mas que possuem a magia e o mistério. Essas eu temo. Já há aquelas maliciosas que lançam seu olhar, se aproximam e devoram a alma do poeta, o destroem. Essa o poeta deseja ardentemente, mesmo que dure uma semana, um dia, um segundo. E há aquelas encantadas que trazem a felicidade nos olhos e fazem o poeta renascer, florescer; a estas o poeta do olho não escapa, pois basta vê-la, porem se não houver possibilidade de conquista o poeta estará condenado a vagar eternamente com a imagem da bela cravada na testa, brilhando na mente. Ele se recordará das manhas, quando era criança e de todos aqueles momentos felizes iluminados pelo sol da manha, sentindo o frescor da relva molhada, do céu das nuvens, das flores entreabertas, do balanço, do sorriso e de todos aqueles momentos felizes que nunca aconteceram. O poeta da boca é filho da alma louca. Adora o membro entreaberto, transbordando desejo, ofegante, salivando, as narinas alteradas, as pupilas dilatadas. Este é o atacante que na falta do gesto mergulha no vicio sentindo o fogo aquecer-lhe as ventanas até o afogamento nas entranhas. Este é incorrigível, pois ama com lasciva e deseja com caridade, benevolência. Ao poeta da boca basta um sim para os lábios se grudarem, as línguas se beijarem e a saliva atravessar tranqüila o oceano de hormônios em desalinho.  O poeta da boca projeta seu corpo, inteiro. Com suas mãos e seus dedos flutua sobre o corpo cheiroso, suado e macio. Seu desejo é a união, até o gozo, até o ventre. E quanto ao poeta do meio, afirmo que este é imprevisível, às vezes devasso, outrora abatido. Esse controla sua fúria de acordo com a temperatura e a pressão ambiente. É capaz de mil loucuras na sombra escura, longe dos olhares pudicos e salientes. É capaz de abstinência, reclusão e até hibernação se a caça estiver a distancia ou a operação for muito arriscada. O poeta do meio possui o sangue animal eriçando fertilidade, desejo, dentes afiados, unhas, língua solta, o membro rígido, atacando, sendo atacado, mergulhando, indo e voltando, devagar, rápido.
Acariciando, tocando, pegando, mordendo.
Beijando, chupando.
Envolvendo, abraçando, cruzando.
Suor, gemidos, lágrimas e sorriso.
Morte.
Descanso.
Pausa.
Reflexão.
Até a próxima ereção.
O poeta do meio é intenso como o sol do meio dia. Penetrante, queimante até o amanhecer.
-          Qual deles é você?
-          Isto depende de você. De seu olho, sua boca, seu meio.
-          Então se meu meio te atrair nós nunca chegaremos à idade do olho?
-          É possível que isto nunca seja necessário, pois dependemos do matrimonio, da união de nossos corpos, só eles sabem o necessário. O poeta é a expiração da necessidade da carne, do que falta para selar a união e lacrar a porta da agonia. Para você é importante que saibas que o poeta do olho, da boca, e do meio habitam o mesmo homem, talvez em diferentes medidas de homem para homem, não sei. Agora que possuis o segredo dos homens podes controla-los em certo ponto obtendo assim a realização de todos os teus desejos, desde que faças o necessário receberas em troca. A equação é resto zero com grande consumo de energia.
-          Ah se fosse tão fácil assim!
-          Ah mulher, pois este é o teu problema e nossa guerra: O QUE TU QUERES. Não conheces o mundo dos homens, seus espaços e suas zonas de ejaculação. Nosso mundo é externo. Mil vezes ereção até o por do sol. Teu mundo mulher é como as fases da lua, noturno e incrivelmente belo, porém extremamente mutante e transitório. Teu corpo mulher atravessa todos os poetas, devora a todos e não se satisfaz. Teu jogo mulher não possui carta marcada nem escondida na manga e isso é verdade, porem tudo muda se hoje for o 2º ou 5º dia da semana.
-          E quando o poeta é verdadeiro?
-          Há o poeta do gozo, este respira com tranqüilidade. Quanto às mulheres ainda não sei quando zero é zero. 

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